[020] Da procrastinação metafísica
Tomei um gancho do Zuckerberg. De novo. Hora dessas meu perfil será permanentemente deletado, pelo tanto que eu infrinjo os termos de serviço do Facebook por cometer a violência de chamar gente imbecil de imbecil e por mandar calar a boca quem deveria calar a boca. Enfim. Ano passado eu escrevi isto aqui por lá. E não posso compartilhar de novo lá, pois estou suspenso. Então compartilho aqui mesmo.
Eu tenho um problema com todas as religiões. A saber: eu não sou um idiota crédulo que acredita em imbecilidades metafísicas. Mas tem uma, em particular que me diverte, porque acho que é, de todas as que existem, a mais sincera em seu desespero existencial: o espiritismo.
O espiritismo me diverte porque, em primeiro lugar, tem aquele lance de parecer um sistema de RPG: três livros básicos (Livro do Mestre/do Médium, Livro dos Monstros/dos Espíritos, Módulo Básico/O Evangelho Segundo o Espiritismo), todo mundo ao redor de uma mesa fingindo que um monte de coisa que não tá acontecendo tá acontecendo pacaralho, encarnando personagem, a porra toda.
Mete umas fichas e umas jogadas de dados e pronto, dá pra chamar a molecada pra curtir uma sessão no fim de semana.
Em segundo lugar porque o espírita não percebe que ele não passa de um procrastinador. O Espiritismo é a procrastinação como filosofia religiosa. Não deu pra resolver algo agora? A gente resolve na próxima encarnação, relaxa. Ficou algo pendente na tua relação com quem morreu? Tranquilo, do lado de lá a gente acerta.
Também existe o lado cruel e escroto do espiritismo, que é o que prega que pessoas que estão sofrendo aqui e agora precisam sofrer, elas estão aqui pra isso, é parte de seu crescimento espiritual, etc. Nunca vi uma forma tão burguesa de aplacar a própria consciência diante das injustiças do mundo.
Mas o que eu mais gosto mesmo é esse negócio da procrastinação. Do deixa isso pra depois. É isso que o espírita faz com seu vazio existencial. Veja, o espírita adora agir como se essa bobagem na qual ele acredita fosse uma ciência. Ele diz que "estuda" o espiritismo, porque, óbvio, é tudo muito bem documentado, revisado pelos pares, existem provas e contraprovas... O espiritismo é praticamente um Lattes psicografado. Então você pergunta ao espírita qual é o propósito da nossa existência e ele responde sem titubear: evoluir.
E pronto. Tá sanada a questão, certo? Está justificada a nossa vida na terra. Estamos aqui pra evoluir. Maravilha.
O que ele não percebe é que só empurrou a dúvida pra um segundo momento: estamos aqui pra evoluir pra quê? Com que finalidade? Daí ok, você vem pra cá, alma sebosa, se rala nas ostras, se fode pra caralho, mas daí aprende, se ilumina. Evolui.
Aí você vai pra outro plano, um plano de almas mais evoluídas. Pra quê?
"Pra ajudar as almas menos evoluídas a evoluírem".
Ok. Pra quê?
A questão final, ou seja, por que caralhos você existe, qual é o objetivo, o motivo, a razão da sua existência, continua sem resposta. A evolução é uma justificativa transitória: por que diabos deus precisa desse bando de almas evoluídas? Ele é um treinador de pokémon cósmico ou coisa parecida?
Mas é claro que o espírita não vai pensar nisso agora.
Ele pensa nisso depois.
Em outra vida, talvez.
Apareceu um Poltergeist, rola iniciativa!